O Canto Livre <br>ainda anda por aí...

Nuno Gomes dos Santos

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Foi um movimento de pessoas com cantigas honestas e comprometidas com a luta pela liberdade e, depois, pela sua consolidação, se atendermos ao facto de essas cantigas serem feitas e interpretadas antes ou depois do 25 de Abril.

Muitas das canções eram incipientes e musicalmente pobres, como pobres foram muitas das vozes que lhes deram corpo. Porém, a insuficiência estética não lhe ofuscou a enorme capacidade de comunicação, a grande aceitação junto de quem partilhava as mensagens que elas continham, a sua capacidade de tocar públicos que, por elas, foram descobrindo caminhos a percorrer pela vida que desejavam.

Falar de pobreza estética, no entanto, não é generalizar. No Canto Livre nasceram, ou cresceram, cantores, autores, compositores e músicos de grande qualidade, que partilharam palcos, uns mais improvisados que outros, aparelhagens de arrepiar, transportes improvisados e, muitas vezes, polícias que, contra a arma da cantiga, apontavam mausers e savages.

Muitos dos cantigueiros de então foram saindo de cena, missão cumprida. Outros, porém, fizeram das cantigas modo de vida e de realização e prosseguiram pela estrada dos palcos e do discos, com resultados apreciáveis. Vitorino, Fausto, Janita, os Trovante, Manuel Freire, Samuel, Francisco Naia, Carlos Alberto Moniz, são exemplos disso. E, por isso, o Canto Livre, agora definitivamente livre, ainda anda por aí. Nenhum dos citados atrás se sentirá menos bem por ter esse movimento como referência, antes, penso, será com um certo orgulho que olharão para a postura que tiveram emprestando a voz e a arte ao Canto que foi resistência e afirmação, e ao qual se juntaram, cantando lá fora e depois cá dentro, as vozes de Luís Cília, José Mário Branco ou Sérgio Godinho.

Escrevo esta crónica no dia em que José Afonso faria 73 anos. Diria que senti imperioso escrevê-la quando o dia 2 de Agosto me apareceu no calendário. E porque, ao ouvir gente jovem cantando em bares, como Manuel Loureiro, ou revendo de novo e sempre o Samuel nos palcos, ambos a não saberem como reunir reportório sem nele incluir canções do Zeca, me lembrei de jornadas memoráveis nas quais, juntos (saudades, Adriano!), cantámos «Os Vampiros» ou a «Chula da Póvoa», na qual incluíamos versos de António Aleixo.

Na memória e não só, o Canto Livre ainda anda por aí.



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